Jhonny ficou naquela biblioteca por bastante tempo... leu tudo que pôde, pensou bastante também, tinha muito o que aprender em história, mas ainda estava no comecinho da faculdade, um novato... tinha sede de sabedoria e isso o impulsionava mais e mais.
Afundado naqueles livros grossos e empoeirados, ele tinha pouco tempo para o primeiro exame, muito pouco tempo para aprender o necessário... tinha entrado na biblioteca pela manhã e perdeu a noção do tempo, por vezes retornando ao passado quando a leitura exigia tal esforço, e ele ia à fundo... tinha ótima imaginação!
Já era noite, perto de fechar e as únicas luzes que iluminavam o local eram dos pequenos abajours amarelados salpicados por cima das mesas ao longo do recinto. A moça veio falar-lhe pela terceira vez, queria fechar... mas Jhonny pediu ainda por quinze minutos, estava folheando o último livro, um livro estranho que ele não lembrava ter pego, já ia perdendo o interesse quando encontrou um bilhete dentro dele... na frente tinha... "A quem possa interessar", ele terminou de ler essa frase sendo interrompido novamente pela bibliotecária.
- Senhor, tenho que fechar! - falou a moça já cansada do dia exaustivo.
- Tu... tudo bem... já estou saindo... - respondeu sem dar atenção.
- Se quiser, leve o livro, é só deixar o número da identidade, o telefone e assinar... te dou dois dias para estudá-lo.
- Bom... muito bom! Aceito sim. Deixa eu arrumar essa bagunça me desculpe. - terminou já tentando juntar o amontoado de livros que tinha pego.
- Não precisa senhor, pode deixar... amanhã eu arrumo. Venha comigo, traga o livro por favor!
- Ok... - Jhonny acompanhou-a com o livro e o sobretudo no ombro juntamente com a bolsa... antes deu uma última olhada no bilhete e colocou-o no bolso da calça... seguiu a moça até o balcão.
Enquanto assinava o livro de empréstimos era analisado cuidadosamente por Cris, terminou e pegou o livro colocando-o na bolsa, vestiu o sobretudo, deu um sorriso largo para a garota e saiu... ela foi logo atrás fechando a biblioteca e seguiram caminhos opostos.
A noite estava misteriosamente esquisita, mais fria do que o normal e em todo trajeto até o metrô ele tinha a impressão de estar sendo seguido, olhou para trás inúmeras vezes e seguiu a passos largos.
Chegou às escadarias do metrô e desceu-as quase num pulo, pagou o bilhete... por sorte estava chegando um naquela hora, entrou na última porta e sentiu-se sozinho novamente... a sensação era de que alguém o seguia e que ao passar pela porta o que quer que fosse, teria ficado do lado de fora, sentiu-se seguro ... queria distância do que quer que fosse, não sabia as reais intenções do perseguidor... agora, sozinho, sentado, colocou a mão em cima da bolsa, como se estivesse protegendo o conteúdo que carregava.
A viagem pareceu longa demais e Jhonny estava quase se entregando ao cansaço, bateu a cabeça no vidro algumas vezes, mas no último cochilo ouviu nitidamente quando alguém gritou chamando-lhe a atenção, acordou atordoado pela potência daquela voz feminina... instintivamente olhou para o lado e viu quando alguém olhava demasiadamente e sem embaraço para a bolsa dele, Jhonny encarou o estranho, isso fez o homem parar de olhar e ele seguiu a viagem agora totalmente desperto, não queria ouvir aquela voz novamente, ficou com os tímpanos doendo de tão alto que foi o grito.
Finalmente chegou em seu destino, saiu da estação de metrô jurando para si mesmo que da próxima vez sairia em seu carro, era muito mais cômodo.
Andou ainda uns dez minutos pelo quarteirão, chegou em seu prédio e subiu para o apartamento, sexto andar... entrou, tirou a roupa e refrescou-se, caiu na cama logo em seguida dormindo profundamente... mas não antes de guardar o livro num cantinho escondido do quarto.
Depois de um longo sono recheado de sonhos reveladores, ele pegou o livro e o bilhete, colocou ambos em cima da escrivaninha e começou a estudar cada palavra ali contida... "A quem possa interessar"... Do céu descerá feito um raio, virá de todas as partes e de lugar nenhum, sendo o mais poderoso dentre os seres, seu objetivo será somente um. ass. "P"
O que será que quer dizer esse bilhete... pensava intrigado... A confusão nos sentidos só aumentava a insegurança, leu trechos do livro, mas nada referente ao bilhete, folheou-o aleatoriamente e só via invocações, não estava entendendo nada, sem querer deixou o livro cair e quando se abaixou para pegar, estava na página 66 no capítulo 6, no qual se lia... " As trevas estão em toda parte e quem ousar buscá-la terá a seiva sugada por caninos afiados e sua carne dilacerada, por garras sedentas e assassinas... teu corpo morrerá, mas tua alma escravizada estará!"
- O que será que quer dizer isso? - pensava roçando o lápis na boca... - Eu vou descobrir!
Como o trecho falava em trevas, Jhonny logo pensou na noite, e como encontrou o livro por acaso, de repente saindo descobriria mais alguma coisa em algum lugar da cidade, a mínima idéia de que pudesse estar enlouquecendo nem chegou a passar na mente, curioso e ansioso por mais, não pensou duas vezes, vestiu-se e saiu em seu carro em parte, pra arejar a cabeça.
Rodou pelas avenidas, algumas desertas, outras com algum movimento... uma coisa era visível, as prostitutas nas esquinas e becos... ele não imaginou que fossem tantas. De repente no meio de todas aquelas mulheres, uma em especial chamou-lhe atenção, ela não era igual às outras, era muito bela e diferente... destacava-se das demais.
Quando o carro passou os olhares de ambos se encontraram e o brilho púrpura do olho da mulher fez com que o comando fosse passado mentalmente. Ele parou o carro de súbito, a mulher chegou perto e entrou... olhando para ele, soltou algumas palavras numa língua estranha, Jhonny franziu a testa... não entendia nada do que ela dissera e de repente ela começou a falar em sua língua, uma frase apenas, numa voz perturbada, ela repetia... "Ele está em todas as partes... ele está chegando!", ouvindo aquilo Jhonny teve certeza que tinha achado o que procurava.
Após algumas repetições, a garota olhou ternamente para Jhonny e sorriu. Naquele momento pareceu que ela nunca dissera nada... ou pelo menos nada grave... já que tudo aquilo era uma charada para ele.
O rapaz acelerou o carro levando a mulher dali, nem sabia seu nome ainda, mas... nada mais pareceu importar... ela parecia um anjo.
Chegou próximo a uma mansão muito antiga, já estava até condenada, mas ela abriu a porta do carro fazendo Jhonny frear bruscamente, ela desceu e entrou no casarão indo cada vez mais para o alto... Jhonny tentou fazer com que ela não fosse, e se tudo aquilo desabasse? Sem opção teve que seguí-la, ela parecia não ouvir seus pedidos... Jhonny subia pelas escadas com os olhos arregalados, como que procurassem por algo... algo que o ajudasse a decifrar o livro.
À medida que subia, as paredes começaram a mudar assumindo uma característica rústica, muito antiga... dava pra notar inscrições rubras em seus tijolos espaçados... Jhonny olhava e não entendia e muito menos ainda o porque das inscrições brilharem na passagem da garota.
Ele notou seus cabelos longos movimentando-se como se alí dentro tivesse uma forte corrente de ar e as roupas mexiam bruscamente deixando a mulher quase nua. A ventania sinistra deixava em evidência as coxas bem torneadas da estranha que parecia não se importar.
Chegaram numa espécie de câmara, onde tinha um altar, a mulher despiu-se, não se importava com a presença de Jhonny, ficou em frente ao altar como que em transe e de novo começou a falar palavras atropeladas numa língua que o rapaz não compreendia, então veio uma luz e invadiu o lugar.
A mulher gritava palavras estranhas, a luz aumentava a intensidade e Jhonny já tampava os olhos, não estava enxergando nada, só ouvia as palavras e aquilo causava-lhe calafrios, as vezes com gritos outras vezes calmos, até que sentiu quando a luz foi enfraquecendo e aos poucos ele conseguiu olhar... o corpo da mulher ainda brilhava e ao terminar ela caiu desmaiada.
Ela estava diferente, mais ruborizada e até seus cabelos assumiram um tom vermelho muito bonito, Jhonny pegou-a no colo e colocou-a deitada no altar... admirava-a enquanto tentava reanimá-la... após as tentativas do rapaz ela abriu os olhos e sorriu para ele... em seu corpo eram visíveis as tatuagens bem trabalhadas que haviam se formado durante o tempo que a mulher passou em transe... desenhos estranhos.
Jhonny estava curioso, queria saber o que ela tinha dito e porque ela tinha feito aquilo... como as tatuagens apareceram... mas ela não disse uma palavra, só olhou-o por um breve tempo... e lentamente adormeceu.
O rapaz cobriu-a com um manto negro que tinha num dos cantos da câmara e desceu com ela, e como estavam numa casa, pensou em achar um quarto com uma cama confortável por alí mesmo para ela descansar, a chuva caía torrencialmente do lado de fora e ele havia parado o carro um pouco distante do portão, após acomodá-la sentou-se na poltrona e ficou velando o sono da bela mulher.
Ela dormia lindamente, de vez em quando ronrronava feito uma gata, por vezes chorava e falava alto, talvez algum pesadelo... mas ele não compreendia nada, além dela falar em outra língua, na maioria das vezes eram palavras atropeladas.
Até que Jhonny caiu no sono e acordou no outro dia com o cheiro de café da manhã no ar.
- Como conseguiu tudo isso? - perguntou espantado.
- Peguei dinheiro na sua carteira bobinho... se importa? - ela falou docemente.
- Não, claro que não. - respondeu já sentando à mesa.
- O que foi aquilo na outra noite? - olhou-a curioso.
- Aquilo? Aquilo o quê? - seu rosto era de inocência.
- Você não se lembra?
- Lembrar do quê? - ela estava começando a ficar séria.
- Nada deixa pra lá... adorei o tom vermelho dos cabelos.
- ah, tá bom... eu sempre os tive assim querido... o que está acontecendo com você? - terminou achando graça do que ele falara.
- Como? - Jhonny olhou em volta, tudo estava diferente, limpo... parecia realmente um lar.
O rapaz olhou em volta... - como aquilo teria acontecido? A casa estava um horror antes, e... Querido?? Ela me chamou de querido? O que está havendo? - o rapaz levantou-se e abriu a porta.
- Onde vai amor? - a voz veio como uma doce súplica.
- Trabalhar... - respondeu a primeira coisa que lhe veio a mente.
- (risos) Gostei da piada, você nunca trabalhou no domingo, por que começaria agora?
- haa... é... vou para o quarto então, preciso descansar!
- Está bem querido... depois vou também... deixa só eu terminar umas coisinhas por aqui.
- Está bem... "querida"... - falou já subindo as escadas.
A medida que subia via fotos deles dois e uma família, seu casamento... mas não viu filhos...
Entrou no quarto... tudo lindo e arrumado. Deitou-se sem demora, pegou no sono pedindo pra que voltasse à casa dele, às coisas dele... e durante o sono teve muitos pesadelos, os mais horríveis possíveis... sonhou com a sua então esposa o matando com um picador de gelo... e o rasgando aos poucos com um olhar tétrico... acordou assustado e viu a mulher perto dele, fitando-o.
Ela veio em cima dele beijando-o, tirando a roupa e revelando a lingerie negra que destacava-se em sua pele alva... mas o sonho de Jhonny veio mais forte ne mente dele e ele saiu da cama desculpando-se da mulher, que fez uma cara de raiva... foi enfim encarar uma ducha fria.
Olhou-se no espelho e socou o próprio rosto... se beliscou até tirar sangue... queria acordar daquele pesadelo... daquela vida que não era a dele, mas não adiantou... a mulher brava continuou na cama à sua espera, mas ele não voltou, em vez disso desceu e foi até a cozinha pegou uma cerveja e ficou pensando.
Enquanto balançava a cerveja entre os dedos, ficou tentando refazer mentalmente todo o trajeto desde que saíra de casa e fechou os olhos, em sua mente chegou até onde encontrou a mulher naquela rua, concentrou-se mais e se lembrou de quando ela falou... - foi acordado de seus pensamentos pela doce voz, no susto deixou a garrafa se espatifar no chão respingando de cerveja o armário... seus olhos não paravam de fitá-la e ela retribuía num encantador sorriso.
- Nossa, o que eu fiz... deixa q eu limpo. - falou tentando sair do transe que a mulher lhe causara.
- Não precisa, pode deixar. - a mulher carinhosamente pegou o pano da mão dele.
Enquanto ela limpava o chão, Jhonny tentava pensar, sabia que aquilo não era normal, queria saber onde estava o livro e principalmente queria saber como sair do pesadelo que a mulher o tinha instalado... e começou...
- Quem é você de verdade? Confesse!! - falou o rapaz tomando distancia dela.
- Ué, quem eu poderia ser Jhonny, sua esposa Pauline, é claro! - respondeu sem encará-lo.
- Vamos acabar com essa palhaçada... o que quer de mim monstro! - continuou tentando conseguir algo.
- Você não está em seu juízo normal... Jhonny querido, sou eu, sua mulher, namoramos desde o colégio.
Jhonny caminhou devagar para as gavetas do armário, a mulher encarava-o séria, prestando atenção em cada movimento, ele por sua vez procurou pela gaveta certa... achou o que procurava, uma faca grande de cortar carne. Fitando-a por um longo tempo retomou a conversa.
- Você não vai me dizer então vou descobrir sozinho... - terminou apontando a faca para o próprio peito.
- Não! Não faça isso... estará fazendo o que ele quer.
- Ele quem? Desembucha logo. - falou irritado.
- Gael... um demônio extremamente poderoso e que está criando toda essa ilusão.
- Porque eu?
- Porque você tem o livro... ele quer o livro, e eu quero que ele não encontre. Não me importa com quem esteja, desde que não seja com ele... - finalmente a mulher sorriu, agora de forma diferente... ela tinha presas.
- O que você é? Também um demônio? E estão disputando minha alma? - ele ainda tinha a faca apontada para o peito.
- Ha ha ha... disputando você? Você pode até ser docinho... mas meu objetivo é proteger o portador do livro! Estou aqui a trabalho meu querido. - ela agora já tinha assumido uma entonação de voz diferente... falava sensual, porém com picos de crueldade, seu olhar antes inocente... agora despejava luxúria e seus movimentos pareciam os de uma felina.
- Mas você também é um demônio... não vejo diferença na sua classe.
- A diferença é... você ainda está vivo... embora não totalmente intocado. - terminando de falar ela passou os dedos nos lábios com jeito sapeca.
Jhonny não estava acreditando no que ouvira, além de estar preso num sonho, ainda servia de alimento e nem se lembrava disso... pensou no livro, de repente se o encontrasse conseguiria fazer tudo voltar ao normal, mas estava muito, muito longe. Não sabia o que fazer, nem o que pensar... queria tentar pelo menos sair dali, mas a mulher estava entre ele e a liberdade, não conseguiria passar por ela. A única saída que se mostrou foi ou desistir, ou atacar... partiu pra cima da mulher com a faca levantada e com ira nos olhos, não estava mais raciocinando, estava agindo por impulso.
Rapidamente Pauline segurou Jhonny pelo pulso e apertou um pouco, ele deixou a faca cair, gemendo de dor, ela era muito forte, ela envolveu-o pelo pescoço e roçou seus lábios carnudos nos dele... Jhonny sentiu uma pequena vertigem... por um momento a cozinha pareceu rodar... ela sem se abalar com as tentativas dele de escapar, continuou... roçou os lábios pela sua face e chegou em seu pescoço... beijou-o e lentamente chegou em seu ouvido.
- Tudo isso é uma brincadeirinha dele... se eu quiser posso te libertar... pena que não vou mais poder brincar com você, estava gostando tanto... - a mulher sussurrava ora dando pequenos beijos na orelha, ora passando a língua em seu lóbulo... - Sabe, nunca tive um brinquedo tão... apetitoso e interessante, mas se eu ficar aqui com você, assim que ele souber onde está o livro... ele irá buscar, não posso correr esse risco! Vou sim te libertar, mas ficará por sua própria conta... se lembre do bilhete no livro... alguém mais poderoso que eu virá, só não sei o momento, para te ajudar, nesta hora espero não estar perto... agora antes de você ir...
Ela mal terminou de falar, cravou os dentes bem fundo na jugular do rapaz, que quase gritou de dor, Jhonny se agarrou à ela com tamanha força tentando abreviar a dor, mas era algo muito potente, parecia que ela ía arrancar a cabeça dele, tamanha foi a força da mordida... a vampira sugou o quanto pôde e o quanto ela sabia que ele poderia aguentar... era a última refeição nele e queria aproveitar, mas sem matá-lo, ele continuaria sendo o portador do livro... ela terminou lambendo o ferimento e antes de soltá-lo deu-lhe boa noite, sumindo logo em seguida.
Ao acordar, Jhonny estava caído no meio do salão do casarão condenado, os ratos passavam por cima dele, foi acordando e enxotando os bichos que transitavam, sentiu dor de cabeça, a base da nuca doía e o pescoço... parecia que tinha levado uma surra. Lembrou-se de tudo, estava fraco, queria ir para casa... levantou-se cambaleando e saiu na chuva, tropeçou algumas vezes no trajeto até o carro, chegando perto da porta, pegou as chaves do bolso e abriu-a nervoso, entrou, sentou e respirou fundo sujando o carro de lama. Não sabia o que pensar... estava no meio de uma guerra que ele talvez não pudesse lutar, afinal era somente um simples humano, logo pensou no padre Kall e como ele sempre fora atencioso oferencendo ajuda sempre que precisasse, ainda não havia precisado, mas era chegada a hora e acabou decidindo por levar o livro para a igreja... girou a chave na ignição e respingou lama pra todo lado, saindo do acostamento e pegando a principal rapidamente, iria de imediato no padre, seu amigo, não queria demorar nem mais um minuto... enquanto dirigia até em casa, sentiu de novo a estranha sensação, alguém o seguia e agora a presença era ainda mais forte, tão forte que ele pensou ter sentido um cheiro estranho... seu corpo tremeu, mas continuou com seu plano.
Chegando mal parou o carro já pulou pra fora, subiu feito um louco até seu apartamento, foi até onde estava o livro e o retirou do lugar onde havia colocado...
- Ah! Quer dizer que estava aí, seu bastardo! - falou uma voz gutural vinda do canto do quarto.
- Q... qu... quem é você? - Jhonny até ja sabia a resposta, mas precisava ganhar tempo.
- Eu sou seu pior pesadelo, humano tolo... ha ha ha ha... - o vampiro soltou uma gargalhada que deixou-o quase surdo.
Jhonny correu pra fora do quarto enquanto o vampiro ia andando atrás dele, alcançou o corredor e desceu as escadas desesperado... a todo momento ouvia a voz da criatura falando maliciosamente de como iria matá-lo, e que todo aquele medo em seu sangue estava-o deixando excitado... o rapaz continuou correndo e alcançou a porta de saída, entrou no carro e saiu em disparada, bateu numas latas de lixo e quase terminou no poste próximo... seguiu viagem até a igreja.
O vampiro não o tinha seguido, mas Jhonny sentia aquele cheiro que impregnava suas narinas deixando um gosto ruim na boca... não demorou a chegar na igreja, no meio do caminho ligou para o padre Kall, este já o aguardava... parou o carro numa manobra arriscada perto dos degraus e quando ia subir a escadaria, deparou-se com o vampiro à sua frente... parou de súbito e ficou encarando a criatura que sorria cruelmente, ele não sabia o que fazer, seu corpo começou a tremer, segurou com mais força o livro e o suor já descia pelas têmporas, um suor gelado evidenciando todo seu pavor.
- Venha meu filho! - gritou o padre.
Jhonny tinha que passar pela criatura, mas não sabia como, de repente do nada apareceu Pauline, que segurou por trás o seu senhor.
- Mulher tôla... vai mesmo morrer por um reles mortal? - indagou o vampiro furioso.
- Adivinha!! - a vampira sorria. - Vai Jhonny, passa rápido, não posso segurar muito tempo! - gritou a vampira para o rapaz.
Jhonny passou pelos dois correndo e quando chegou perto do padre Kall, a vampira tinha perdido a batalha e agora estava no chão com o ser das trevas prendendo-a com o pé pelo pescoço, apertando, ela lutava, mas não conseguia se desvencilhar... quando olhou para o lado, para onde Jhonny havia ido avistou o padre Kall quase pegando o livro das mãos de Jhonny...
- NÃÃÃÃÃOOOOO!!!!!! - gritou Pauline desesperada.
Jhonny parou de súbito e olhou para a vampira, não estava entendendo mais nada...
- Não entregue... ele é um carniçal... é um maldito carniçal!!
- O quê?
Jhonny estava com os olhos arregalados, olhava dos vampiros para o padre... padre Kall insistiu e pediu novamente o livro, mas o rapaz não entregou, havia entendido o que a mulher tinha falado.
- Sua vampira burra!! Maldita!!! - o vampiro pressionou ainda mais o pescoço de Pauline.
- J... Jho... Jhonny, eles querem libertar... arght... libertar Lúc... Lúcifer!!!!!!!!!!!!!
Aquela revelação caiu feito uma bomba nos ouvidos do rapaz, desesperançoso, ele caiu de joelhos segurando o livro à sua frente e logo lágrimas involuntárias deceram-lhe pela face... ele olhava o livro enquanto os pingos grossos molhavam a capa de couro envelhecida.
O vampiro por sua vez, num só golpe separou a cabeça de Pauline do restante do corpo... a mulher ficou alí na frente da igreja, o sangue converteu-se do vermelho para o negro em segundos e foi escorrendo pelos degraus.
O ser das trevas olhou para Jhonny e para o padre, seu escravo, os olhos do vampiro assumiram uma cor avermelhada jamais vista, ele estava agora perto, após tantos séculos do que mais queria, assim ele poderia trazer o inferno para a terra... Lúcifer a quem ele serve e suas legiões, poderiam banquetear-se da raça humana até não sobrar nada além de trevas.
Padre Kall por sua vez investiu contra Jhonny que com o livro em punho levantou-se golpeando o padre de baixo para cima fazendo-o cair para trás, batendo a cabeça nos degraus perto da porta e morrendo logo em seguida... Jhonny espantou-se com a força que empregou no golpe... a força que naquele momento descobriu ter.
Olhando para o lado o rapaz viu o vampiro com suas presas e garras afiadas e brilhantes vindo em sua direção, Jhonny olhava em pânico aquele ser monstruoso que se aproximava sorrindo friamente, seus olhos parecendo dois faróis de sangue, de sua garganta vinha um som tenebroso que incomodou Jhonny ao extremo... o rapaz falava para si mesmo para sair, para andar, sair do lugar, tentar até a última chance escapar da morte certa, até que de súbito disparou pra dentro da igreja, quem sabe alí o demônio não entraria, mas estava enganado e logo atrás de si viu a besta que salivava como se caçasse sua presa, Jhonny correu até o meio da igreja e de repente os bancos começaram a ser arremessados para frente fazendo-o retardar sua fuga.
Com todo custo Jhonny chegou ao altar e procurou por algo... ficou tateando o chão, as paredes, deveria ter alguma coisa alí que o ajudasse, até que seu pé derrapou perto da parede e entrou num buraco... olhou mais de perto, era do tamanho exato do livro, o vampiro vendo que perderia arriscou usar de sua rapidez, mesmo tendo que gastar mais sangue para isso, sem pensar já estava na frente do rapaz, não poderia perder o livro de novo... rapidamente, antes que Jhonny se desse conta, o monstro já estava segurando sua garganta, com a boca escancarada aproximando do pescoço dele enquanto a outra mão tentava segurar o livro, mas Jhonny o soltou e o livro encaixou-se perfeitamente no buraco, as presas do vampiro perfuravam com ódio a carne do rapaz em busca não só de sangue, mas também de sua vida... a criatura colocou tamanha força na mordida que Jhonny gritou desesperado, mas totalmente imóvel, não conseguia mover um dedo sequer durante o abraço da morte.
Gotas do sangue de Jhonny caíram em cima do livro e este brilhou com tamanha intensidade que terminou cegando a criatura fazendo-o soltar o rapaz... o brilho assumiu todo aquele lugar, não dava para enxergar nada, dos vitrais da igreja escapavam raios de luz avermelhada que foi enfraquecendo e aos poucos tornando-se tão claro quanto o próprio dia.
Quando o clarão passou, o vampiro olhou para o chão e viu o rapaz desacordado, mas atrás de Jhonny havia um brilho que foi tomando forma e apavorou o vampiro enfurecendo-o ainda mais.
- VOCÊ!! VOCÊ AQUI????? - vociferou o monstro.
- Tsc, tsc, tsc... mas você não aprende demônio. - falou a voz calmamente.
O vampiro demonstrando todo o pavor arreganhou os dentes, estava tomado por um ódio sem tamanho... fez menção de atacar como se fosse uma fera acuada.
- O QUE QUER MIGUEL??? NÃO BASTA TER ME IMPEDIDO DA ÚLTIMA VEZ? AINDA TEM QUE VIR AQUI TAMBÉM? - o vampiro continuou em posição de ataque... mas não seria tão burro.
- Você sabe Gael, que sempre apareço... por que insiste? - a voz do anjo era de uma doçura sem igual.
O anjo por sua vez deu um passo empunhando sua enorme espada de fogo, a chama forte crepitava em suas mãos... o vampiro em posição de ataque/defesa, foi dando passos para trás, tentou calcular fugir dalí, mas não teria tempo e continuou encarando o ser divino.
Miguel continuou andando, a espada em punho amedrontava o vampiro, ele não tinha escapatória... olhando de relance para a porta o vampiro tentou uma investida, mas o anjo com um bater de asas fechou-a num rompante.
Jhonny no altar parecia morto, continuava deitado do mesmo jeito que o vampiro havia deixado... nem se movera.
O vampiro de novo voltou os olhos rubros para o anjo e tentava ameaçá-lo com suas presas pontiagudas... grunhia ferozmente mas, Miguel continuou sereno, nada daquilo o abalava.
Quando o vampiro finalmente viu que não tinha escolha, tentou investir contra Miguel com seu ataque mais poderoso, mas Miguel nem teve o esforço para repelir o ataque e dividir o vampiro ao meio, que sequer sentiu a presença do golpe devastador... Explodiu logo em seguida sem deixar rastros.
Miguel encheu o lugar com seu aroma adocicado, chegou perto de Jhonny e tocou-lhe a fronte... depois sumindo numa luz brilhante.
No outro dia Jhonny acordou bem, não sentia dores, passou a mão no pescoço... apenas um arranhão... cicatriz que não lembrava como tinha adquirido e em cima de sua escrivaninha, o grande livro com agora outro bilhete... "Obrigado, peço-lhe que continue o bom trabalho... ass. Miguel"
Jhonny pegou o livro, seu sangue continuava nele parecendo uma pintura, o rapaz guardou-o no mesmo local de antes... agora lembrava-se de tudo... da luta... da traição do maldito padre... lembrava-se de Pauline.
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